Cachopo
Agora a sério. Estou cansada. Doem-me as costas. Já não encontro posição pra me sentar no chão. Por estes e muitos mais motivos, vos digo que tou a adorar tar aqui. Os dias são mais curtos, o tempo ganha uma outra dimensão. A dimensão da paz, da calma e do abandono. Aqui o tempo tem identidade própria. E a cada esquina descobrimos mais uma história, um cantinho, uma nova palavra, mais um sorriso.
Não minto se dizer que não tem sido fácil. Têm-me custado bastante algumas actividades. Tem-me custado "assimilar" esta identidade própria do tempo, tão diferente do meu. Aqui as pessoas não têm pressa, não correm, não fazem mais do que uma coisa ao mesmo tempo. E vindo do ritmo que eu vinha, esta travagem abrupta fez saltar das gavetinhas questões outrora deixadas pra uma "análise posterior".
A solidão dos idosos e a sua resignação são outras duas coisas incriveis. Ficam ali, nos seus montes, à espera do nada, à espera da morte. Trazem no rosto as marcas de uma vida dificil e nos olhos o brilho de outros tempos...Não se queixam da solidão a que foram deixados, contando-nos como foi e é a sua vida.
Há uns dias atrás uma senhora de 42 anos, com 3 filhas (a mais nova com 10 anitos) enforcou-se. Como não poderia deixar de ser, este caso foi motivo de falatório na aldeia de Cachopo e nos montes vizinhos. Pelos vistos, a senhora sofria de depressão e já se tinha tentado matar com comprimidos. Desta vez tentou-se enforcar, com sucesso. A sua "coragem" pra cometer este acto foi logo atribuida ao "Demo", já que ela "bebia e fumava" mais do que devia e, claro, "não teria forças pra cometer tal acto sozinha".
Este é um Portugal que me era, por completo, desconhecido. Como aqueles que me conhecem sabem, não tenho familia nem nenhuma ligação com qualquer tipo de comunidade rural. Daí o meu espanto e choque. Nesta realidade e nestas pessoas a vida é diferente, tem outro sentido. Acaba por assumir outra dimensão. Uma dimensão mais sofrida mas mais humana.
Daquelas que nos fazem pensar no que é realmente importante. A falta da Internet vai sendo superada, os Coldplay tocam apenas quando fecho os olhos. A novela é substituida pela oração com a comunidade, por conversas e canções ao som da viola, sob um céu de estrelas.
É bom cá estar. Mas também é bom saber que, no Domingo volto prá minha realidade. Para a minha casa, a minha cama, para a minha música e as minhas coisas.
Mais rica e mais serena. Mais queimada por este sol abrasador e em paz. Comigo e com este novo mundo que todos os dias vou descobrindo.
E..sabe bem. Quando vemos os seus sorrisos desdentados, as mãos calejadas e o coração do tamanho do mundo, percebemos como são felizes. E como nos dão, sem cobrar nada em troca, um pedaço da sua vida.
E, partilhando a sua felicidade, nos fazem felizes.
3 Comments:
muito bom de ler. espero que tenham corrido bem os últimos dias do projecto!
correram! :)
lol
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