Há uma parte de mim que lá ficou. Há uma parte que ainda não voltou. Que se perdeu ali, em Vilar Formoso, nos braços dos abraços. Há uma parte que veio comigo. E que ainda sorri ao lembrar dos sorrisos, dos abraços apertados, as palavras de consolo, dos olhos, olhando não sabemos ao certo o quê. Apenas olhando, gravando na memória rostos, expressões, calando lágrimas que se disfarçam em mais sorrisos, apertando junto ao peito aqueles que, durante nove dias, marcaram nossas vidas e partilharam momentos, cafés, cigarros, noites de estrelas e dias de chuva, missões de sol e muito cansaço.
Há uma parte de mim que já não me pertence. Há um pouquinho, de alguns (todos), que trouxe comigo. Chama-se a isto partilhar. Poderia ir pelo caminho fácil e simplesmente descrever o factual, o objectivo, tudo aquilo que se passou e que vivemos. Para isso terei tempo. Para relatar o cansaço das horas de viagem, as chegadas e partidas de cada lugar, a construção da missão. Mas agora (e porque o “fácil” não faz parte de mim) quero mais do que isso. Quero prender uma infima parte às palavras...cada sorriso, cada lágrima, cada incerteza, cada mão que ajudou, cada ombro que consolou, o cansaço (e a persistência). Quero prender ao “aqui e agora” a paz de alma que me invade, as tormentas que ficaram lá longe, perto de França. Os risos, as músicas, os elefantes, a preocupação com os outros, as noites estreladas…tudo isso veio comigo.
Estar lá, beber daquela paz e construirmos, juntos, uma missão, foi a parte fácil. O Paquito começou em Aveiro, na despedida sentida, ao pôr-do-sol. Começou quando os sorrisos se desvaneceram e começaram a dar lugar às memórias, às piadas e recordações de situações caricatas. Começou quando, ao deitar, não disse boa noite à minha vizinha do lado (a Rute) ou à de cima (a Rita). Começou assim que o comboio deixou aquela estação.
Começou assim que vi pela última vez o teu sorriso.